Blog Comunicar em Saúde
Mais do que ouvir: 7 estratégias de escuta ativa na comunicação em saúde
4 julho 2025, PATRÍCIA RODRIGUES

Os doentes valorizam profissionais que os escutam e demonstram interesse pelas suas perspetivas e valores. Contudo, não sentir-se ouvido é uma queixa frequente em relação à comunicação com os profissionais de saúde. A chave para resolver esta divergência é a prática da escuta ativa.
Índice
Ouvir, escutar e escutar ativamente
Ouvir é diferente de escutar. Ouvir vem do Latim audire, que significa ouvir, perceber pelo ouvido. Já escutar vem do Latim auscultare, significando ouvir com atenção ou tornar-se atento para ouvir. Assim, podemos considerar que ouvir é um processo fisiológico e passivo, enquanto que escutar é um processo ativo, consciente e intencional.
No contexto da comunicação com o doente, a escuta ativa é uma competência de comunicação centrada na pessoa. Envolve dar-lhe atenção total, procurando compreender o que é dito e o que não é dito, tal como emoções, valores e expectativas. A escuta ativa permite-nos compreender a pessoa, e não apenas ouvir o que esta tem a dizer.
Benefícios da escuta ativa na comunicação em saúde
A escuta ativa demonstra interesse genuíno e respeito pela experiência do outro. Quando escutamos atentamente, estamos a dizer à pessoa que o que ela diz e sente é válido e importante, conseguindo, assim, mostrar empatia e criar um espaço seguro para a partilha. Por sua vez, ao sentir-se ouvida, a pessoa tende a comunicar mais livremente, o que fortalece a relação terapêutica, constrói confiança mútua e promove a sua participação no cuidado.
Para além de reforçar a relação, a escuta ativa é uma ferramenta essencial para recolher informação clínica relevante e prevenir que questões importantes surjam apenas no final da consulta. Permite ainda compreender a pessoa não apenas na vertente biomédica, mas também as suas expectativas, valores e contexto de vida — elementos essenciais para o cuidado centrado na pessoa.
SAIBA MAIS NO ARTIGO
O papel da empatia na comunicação em saúde
O que não é escuta ativa
Acabamos de ver o que é a escuta ativa. Vejamos agora o que não é escuta ativa:
- Não é ouvir de forma passiva ou desinteressada.
- Não é ficar em silêncio distraído.
- Não é interromper o outro.
- Não é usar apenas perguntas fechadas, que limitam o âmbito da resposta.
- Não é ouvir enquanto se toma notas no computador.
- Não é fazer julgamentos em relação ao doente.
- Não é assumir que sabe o que a outra pessoa pensa, sente ou quer.
- Não é estar a pensar na próxima pergunta.
Barreiras e desafios da escuta ativa nas consultas
Mesmo quando queremos escutar de forma ativa e presente, muitos obstáculos dificultam esta tarefa. Barreiras externas ou contextuais incluem falta de tempo, alta carga de trabalho e registos clínicos que têm de ser realizados durante a consulta. Adicionalmente, temos as interrupções causadas por chamadas telefónicas ou notificações do telemóvel, ruídos, entre outros.
Já as barreiras internas ou pessoais incluem cansaço, stress, tendência para tirar conclusões precipitadas, estereótipos em relação ao outro e preparar a resposta enquanto se está a ouvir. Outra barreira importante é o natural hábito de interpretar a informação que o outro nos dá usando o nosso quadro de referência, que inclui os nossos valores, crenças, experiências passadas e normas culturais.
Superar essas barreiras exige, em primeiro lugar, a tomada de consciência de que elas afetam a nossa capacidade de escutar atentamente e, consequentemente, a interação com o doente. Em segundo lugar, exige uma decisão individual, priorizando a escuta ativa em detrimento das distrações externas e internas.
7 estratégias para praticar escuta ativa na comunicação com o doente
A escuta ativa é uma competência que exige concentração e prática. Esta prática envolve mudanças na forma como agimos e como pensamos. Aqui ficam 7 dicas para praticar a escuta ativa nas suas interações com doentes, familiares e cuidadores.
1. Fazer perguntas abertas
Em vez de privilegiar as perguntas fechadas, que conduzem a respostas curtas do tipo sim/não, dê uso a perguntas abertas, como “Em que posso ajudar?”, “Qual é sua maior preocupação?”, ou “O que é que já tentou fazer para resolver a situação?”.
Isso abre espaço para a pessoa partilhar mais informação, encoraja o diálogo e ajuda o profissional a compreender a perceção, contexto e expectativas da outra pessoa.
2. Não interromper
Parece óbvio, mas esta é uma falha frequente: interromper a pessoa a meio do seu discurso. É necessário dar espaço e tempo para a pessoa pensar e expressar-se. Atropelar a pessoa a meio da sua fala vai fazer com que ela não se sinta ouvida, com que pense que o que diz não é valorizado; consequentemente, ela vai fechar-se.
É também importante interpretar o silêncio do doente. Nem sempre o silêncio significa que a pessoa acabou de falar: também pode indicar que a pessoa está a elaborar o que vai dizer a seguir. Se a interrompemos, cortamos a sua linha de raciocínio e alguma informação importante pode ficar por partilhar. Além disso, o silêncio pode indicar hesitação, eventualmente, por desconforto emocional.
Ouvir sem interromper mostra que estamos interessados no que a pessoa diz, denota respeito, e indica que não estamos apressados para passar para o ponto seguinte.
3. Parafrasear e sumarizar
Sumarizar ou repetir as ideias principais que o doente apresentou (ou seja, parafrasear) não só mostra atenção ao que foi dito, como permite confirmar a compreensão e corrigir eventuais mal entendidos. Nesta interação é importante usar as mesmas palavras do doente, sem acrescentar interpretações ou ideias novas.
4. Contacto visual
Manter o contacto visual mostra interesse e empatia, e permite observar a linguagem não verbal — uma importante fonte de informação. Contudo, o olhar não deve ser vazio e interessado: deve ser natural e presente. Além disso, uma vez que o contacto visual fixo pode causar desconforto a algumas pessoas, desviar o olhar por breves instantes pode ajudar a criar mais espaço na conversa. Importa também lembrar, que em algumas culturas, excesso de contacto visual pode ser considerado falta de respeito.
5. Ouvir antes de anotar
Uma dúvida que muitas vezes me colocam é: “Mas eu tenho tantos registos para fazer durante a consulta, não posso ouvir e registar ao mesmo tempo?”
A escuta ativa sugere que nos foquemos totalmente na pessoa enquanto ela fala. Isso inclui evitar realizar várias tarefas em simultâneo. Assim, no mundo ideal, a resposta seria “Não. Deve ouvir ou tomar notas, não as duas coisas ao mesmo tempo, porque uma delas vai ficar comprometida”.
Contudo, ouvir primeiro e tomar notas depois levanta dois desafios: o tempo curto das consultas/atendimentos e a dificuldade em memorizar tudo o que a pessoa diz. Sendo assim, como proceder? Faça o seguinte:
- Dedique a sua atenção plena durante os primeiros minutos da interação.
- Quando for escrever, no computador ou em papel, diga: “Importa-se que eu vá tomando notas?”
- Sempre que possível, retome o contacto visual e a escuta atenta.
6. Postura aberta
Uma postura corporal aberta inclui braços descruzados, estar virado para a pessoa, ter uma expressão facial convidativa e, se adequado, estar ligeiramente inclinado na direção da pessoa. Além disso, acenos com a cabeça e simples interjeições como “hum-hum” ou breves expressões como “sim”, “entendo” mostram que está a ouvir e a seguir o raciocínio da pessoa.
Mas a postura aberta não diz apenas respeito à linguagem não-verbal. Também inclui a postura mental: estar aberto para a receber a perspetiva do outro, sem a interferência dos nossos filtros internos que nos podem conduzir a julgamentos incorretos ou conclusões precipitadas. Mais fácil dizer que fazer!
7. Desligar as distrações
Uma parte muito importante da escuta ativa é eliminar aquilo que nos impede de ouvir atentamente. De facto, alguns autores dizem que a escuta ativa é mais sobre o que deixamos de fazer do que o que passamos a fazer — o que deixamos de fazer são as distrações. Assim, evitar pensamentos intrusivos, os julgamentos precoces, as atitudes críticas (distrações internas), assim como, tão simplesmente, minimizar a interferência da tecnologia na comunicação (distrações externas), são cuidados simples, mas certamente impactantes.
Conclusão
A escuta ativa é um dos pilares da comunicação em saúde centrada na pessoa. Esta exige dar atenção plena à pessoa, partindo de uma atitude de interesse genuíno. Apesar das exigências do contexto da saúde, é possível praticar escuta atenta com pequenos gestos e escolhas conscientes. Ao escutar com verdadeira presença, criamos relações mais humanas e favorecemos um cuidado mais eficaz, empático e seguro.
If we could all just learn to listen, everything else would fall into place. Listening is the key to being patient centred.
— Ian McWhinney
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