7 perguntas que ajudam a escrever melhores conteúdos de saúde para o público em geral
Publicação: 21 setembro 2020 | Revisão: 6 julho 2022
Introdução
Desenvolver mensagens de saúde pode ser uma tarefa desafiante. Diferenças culturais, níveis de literacia, características demográficas, entre outros fatores, exigem a adaptação da informação às várias audiências, de forma a facilitar a compreensão e decisão em saúde.
Um desses fatores é a baixa literacia em saúde do grupo-alvo, que se traduz na dificuldade em aceder, compreender, interpretar e usar informação de saúde, nas mais diversas situações. Em resposta a esse problema, destaca-se a linguagem clara.
Este artigo baseia-se não só nas estratégias da linguagem clara, mas também da comunicação em saúde. Se é profissional de saúde, trabalha na área da comunicação ou é redator de textos de saúde, espero que as seguintes perguntas e respostas abram uma reflexão que o(a) ajudem a escrever melhores conteúdos, em particular para o público não especialista em saúde.
Pergunta 1. O que é que os leitores querem e precisam de saber?
Este é um aspeto muito importante da comunicação em saúde: saber quem é e quais são os interesses do grupo-alvo — assim conseguirá entregar o conteúdo alinhado com essas especificidades. Para conhecer esse grupo procure responder às seguintes questões:
- Quem são os meus leitores?
- O que é que estes leitores querem saber?
- Quais são os seus interesses?
- Qual a linguagem mais adequada a este grupo?
- O que é que este grupo já sabe?
- O que é que preocupa estes indivíduos neste momento?
A maior parte das pessoas procuram respostas paras as suas dúvidas e problemas e estão pouco interessadas em saber aquilo que não tem aplicação na sua vida. A melhor forma de captar o interesse e a atenção do seu leitor é saber o que ele quer — e escrever sobre isso. Assim, pense no que é que essas pessoas já sabem de guie-as pelas informações que precisam de saber. Se não fornecer informação útil para elas, nada do que escrever terá relevância ou impacto, vai disparar em todas as direções e nunca acertar no alvo.
Ideia-chave: Conheça a sua audiência.
Pergunta 2. Sei qual é a mensagem principal que quero passar?
Depois de conhecer os interesses do seu público é fundamental definir com clareza a mensagem principal do seu conteúdo. A metáfora do tiro ao alvo aplica-se neste caso também, ou seja, não queira passar muitas mensagens ao mesmo tempo, defina o alvo do seu tiro.
As seguintes questões ajudam a estabelecer a mensagem principal:
- Qual é a ideia-chave a reter?
- O que é que o leitor tem de ficar a saber?
- O que é que o leitor deve fazer com esta informação?
- Porque é que isto é importante para o leitor?
Ao clarificar a mensagem central conseguirá priorizar a informação que vai fornecer; consequentemente, o conteúdo será assertivo e objetivo. Em contraste, quando não existe uma mensagem principal bem estabelecida, o resultado poderá ser informação excessiva, desfocada e sem relevância para o público-alvo.
Ideia-chave: Defina a sua mensagem central.
Pergunta 3. Os leitores conseguem perceber qual é o tema do conteúdo, desde o início?
De maneira geral, antes de ler de fio a pavio, as pessoas fazem uma passagem rápida pelo texto para responder a perguntas como:
- Isto é para mim?
- Devo ler isto?
- Preciso de saber esta informação?
- Isto responde a alguma dúvida que eu tenho?
Para ajudar os leitores a compreenderem de que trata o conteúdo, coloque a informação mais importante no início e utilize títulos e subtítulos informativos — sobre os títulos falarei mais adiante.
Uma forma de organizar os conteúdos de saúde para o público em geral é a regra do triângulo invertido, que abordei no artigo anterior. Trata-se de colocar a informação por ordem de importância: a informação mais importante está no início do conteúdo e a informação menos importante está no final. Mesmo que organize de outra forma (exemplo: em perguntas e respostas), coloque sempre no início um resumo com os tópicos mais relevantes.
Ideia-chave: Apresente a informação mais importante no início do conteúdo.
Pergunta 4. A quantidade de informação é adequada?
A tentação de dar muita informação está sempre ao virar da esquina. No entanto, demasiada informação pode sobrecarregar o leitor e isso acaba por não ajudá-lo. A velha máxima “menos é mais” aplica-se a este caso.
Saber qual é a quantidade certa de informação sem sempre é fácil. Por isso, na altura de decidir que conteúdo incluir, coloque as seguintes perguntas:
- Isto é importante saber ou é apenas interessante?
- Se eliminar esta parte perde-se conteúdo importante?
- Faz sentido fazer duas (ou mais) publicações diferentes para fornecer menos informação de cada vez?
- O que está escrito faz sentido ou é preciso de complementar com um exemplo?
- Estarei a diluir a mensagem principal?
Exemplo de folheto informativo sobre cancro da mama
Imagine que uma utente vai a um centro de saúde e encontra um folheto sobre cancro da mama com informações sobre o que é o cancro da mama, dados de prevalência e taxas de mortalidade, sintomas, tratamentos, rastreios. De tudo isto, que informação ficará retida na mente da leitora?… Se o folheto for dirigido, por exemplo, para as mulheres em idade de fazer mamografia, será mais fácil selecionar a informação que interessa a esse grupo e a esse contexto, o que aumentaria a eficácia da comunicação.
Ideia-chave: Selecione e priorize a informação que dá ao seu leitor.
Pergunta 5. A linguagem é simples e clara?
A complexidade da informação é um inimigo da comunicação eficaz e, em saúde, é um problema particularmente frequente. Enquanto especialistas de saúde, estamos tão habituados a utilizar determinados termos (conhecidos por jargão) que nos esquecemos que a população não os conhece ou não os entende totalmente — nem tem de entender, nós é que temos de os clarificar.
Imagine-se a ler um texto relacionado com leis e procedimentos legais, um daqueles textos que, embora seja estrito para o cidadão comum, tem de ler e reler e mesmo assim fica com mais dúvidas do que certezas. É isto que acontece quando pessoas não especialistas leem um conteúdo de saúde que não está adaptado ao seu nível de literacia. O resultado é que a mensagem não chega ao destinatário, e isso é o que queremos evitar.
Para diminuir a complexidade do texto devemos recorrer à linguagem clara, que nos diz, por exemplo, o seguinte:
- Utilize um tom conversacional, dirigido a uma pessoa, e não a um grupo.
- Utilize palavras comuns e evite palavras técnicas e científicas.
- Explique os termos técnicos (quando tem mesmo de os usar).
- Privilegie frases curtas, com uma ideia apenas.
- Recorra à voz ativa.
- Evite abreviaturas.
Abaixo apresento dois exemplos de texto editado com técnicas de linguagem clara.
Exemplo 1
Antes
A cessação tabágica é muito difícil em qualquer grupo socioeconómico, mas projetos bem sucedidos de cessação irão exigir um conhecimento das nuances das normas sociais que influenciam o comportamento tabágico e a implementação eficaz, adaptada e acessível de intervenções nas cidades e nos meios rurais.
Depois
Deixar de fumar é difícil para qualquer pessoa. Fatores sociais e económicos podem afetar esse objetivo. Projetos de sucesso que ajudam a deixar de fumar consideram as regras sociais e económicas que influenciam este hábito. Além disso, usam intervenções eficazes, acessíveis e adaptadas à comunidade.
Exemplo 2
Antes:
O reconhecimento precoce dos sinais e sintomas de um enfarte é fundamental e deve motivar o contacto imediato com o 112. Desta forma reduz o intervalo de tempo até ao início da avaliação, diagnóstico e terapêutica adequada.
Depois:
Se reconhecer os sinais de ataque cardíaco ligue de imediato para o 112. É importante receber tratamento médico o mais rápido possível.
Concorda que depois da edição o texto é mais objetivo e fácil de compreender?
Para saber mais sobre linguagem clara, leia os seguintes artigos deste blog:
Linguagem clara: 9 perguntas e respostas que precisa saber.
Informação de saúde fácil de ler, entender e usar: Contributo da linguagem clara para a saúde
Ideia-chave: Use linguagem clara.
Pergunta 6. O texto está bem organizado?
A organização e disposição do texto é mais um ponto determinante que ajuda o leitor a navegar no conteúdo e a encontrar as respostas para as suas dúvidas. Um conteúdo compacto, com poucos títulos e parágrafos longos, desencoraja a leitura.
Para além da regra do triângulo invertido, as seguintes orientações ajudam a organizar melhor a informação:
- Sumarizar os pontos principais no início e no fim.
- Quando possível, apresentar a informação em listas.
- Ordenar os parágrafos numa sequência lógica.
- Abordar um assunto por parágrafo.
- Repetir conceitos novos, a repetição é fundamental em pedagogia.
- Usar tabelas para facilitar a compreensão de informação complexa.
- Dividir o conteúdo com títulos informativos.
Sobre os títulos, note que estes captam a atenção do leitor. Se forem ambíguos e vazios de conteúdo, poderá perder a oportunidade de “agarrar” o leitor. Assim, escolha títulos informativos, idealmente com a mensagem principal dessa secção, e com palavras e expressões que vão ao encontro dos interesses dos seus leitores, que é a primeira e fundamental etapa deste processo.
Veja o seguinte exemplo de um título de workshop.
Antes
Erros de medicação em diabéticos: um workshop informativo.
Depois
Dicas para tomar os seus medicamentos com segurança: uma aula para pessoas com diabetes.
Neste caso, para além de eliminar linguagem técnica (como “erros de medicação”) ou de uso pouco comum (como “workshop”), a segunda opção vai ao encontro dos interesses do grupo alvo e usa palavras mais conhecidas.
Ideia-chave: Organize bem o seu conteúdo.
Pergunta 7. A informação é concreta e explícita?
A última pergunta leva-nos à avaliação da objetividade da informação.
A informação de saúde deve ser concreta e específica, respondendo às dúvidas e necessidades da audiência. No que concerne às instruções, frequentemente encontramos instruções de saúde vagas, pouco específicas, sem as quais o leitor não consegue fazer o que está a ser pedido.
Repare nos seguintes exemplos:
Exemplo 1
Os alimentos podem ser contaminados na sua origem.
⇒ Informação abstrata. Que alimentos? Quais origens?
Exemplo 2
Os sintomas podem ser ligeiros ou severos.
⇒ Informação abstrata. Sintoma ligeiro e severo tem um significado diferente de pessoa para pessoa.
Exemplo 3
Limpe frequentemente a casa para evitar ácaros.
⇒ Informação pouco específica. Qual é a frequência recomendada? Como limpar?
Exemplo 4
Coma fruta e vegetais.
⇒ Informação pouco específica. Que quantidade de fruta e vegetais?
Exemplo 5
Lave as mãos com água e sabão durante pelo menos 20 segundos.
⇒ Instruções mais concretas e objetivas, que ainda podem ser complementadas com imagens que mostrem as etapas da lavagem das mãos.
Ideia-chave: Dê informação e instruções específicas.
Conclusão
Em suma, quando escrevemos para o público devemos ter sempre em mente os seus interesses e características. O texto deve ser claro, preciso, direto e objetivo. Os conteúdos devem estar organizados de forma lógica para facilitar a leitura e a retenção da informação.
Cabe a quem escreve o ónus da clareza. Demasiadas vezes esta responsabilidade é invertida, cabendo ao leitor decifrar a informação. Ao transformar a complexidade da informação de saúde em materiais que as pessoas entendem e aplicam no seu dia a dia, conseguiremos aumentar os níveis de literacia em saúde e construir uma sociedade mais saudável.
Outros recursos de interesse: plainlanguage.gov/ | Simply put | Center For Plain Language
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